6 de abr. de 2014


 Cleber: "minha seleção é o Corinthians"

06 de Abril de 2014 às 06:04
 

Cleber é Corinthians: ele não quer nada além disso


Cleber foi uma aposta do Corinthians em 2013, e vem se tornando uma realidade em 2014. Sem Paulo André, firmou-se como titular da zaga alvinegra e é cada vez mais reconhecido pela torcida. Mas não espere uma trajetória normal desse baiano de 23 anos. O beque alvinegro diz não fazer questão nenhuma de jogar em um Barcelona e não se comove com a seleção. Ele gosta mesmo é de boxe.

'Eu não era muito fã de bola não, cara. Nunca gostei. Achava perda de tempo. Fica aí jogando e não dá dinheiro. Meu negócio era ganhar dinheiro. Só que um dia eu fui e joguei um torneiozinho no bairro. Aí o cara gostou de mim', disse Cleber, 'suburbano nato' em Salvador, como ele mesmo se apresenta, em entrevista exclusiva
De Mirante do Piripiri, Cleber foi se arriscar em Brasília, no Legião Futebol Clube, clube inspirado na banda liderada por Renato Russo. Mais tarde, tentou a sorte no Paulista de Jundiaí, tempo em que sofreu com uma lesão grave e quando ganhou o mascote Pedro Henrique, seu filho que hoje tem três anos.

Do Paulista, Cleber deu uma volta e foi parar na Ponte Preta. De Campinas, para a reserva do Corinthians. Do banco de reservas de Tite à titularidade com Mano.

'Minha seleção é o Corinthians', diz ele, que exalta o clube atual quando responde sobre os luxos do futebol europeu. 'Para que sair do Corinthians? Só se me mandarem embora, né? Aí vou ter de ir. Mas por mim...', confessa Cleber.

Leia abaixo a íntegra da conversa com o zagueiro que, bem-humorado, fala sobre os planos para o futuro, o gosto musical e exalta sua terra natal.

 Como tem sido esse começo como titular?
Cleber: Para mim está sendo bom. Eu já esperava e está acontecendo agora. Dá uma confiança a mais. A oportunidade pode ser a única, então eu tenho de fazer por onde. Tem de ir até o fim.

: Já sente que a torcida te conhece?
Cleber: Tem algumas pessoas que me conhecem, falam comigo. Eu acho legal. Carinho é muito bom, fico muito feliz. O pessoal vem tirar foto, fala que eu sou um bom zagueiro. Eu tento não me iludir com isso, mas acho legal.

 Fala um pouco da sua vida. Como foi seu começo lá na Bahia?
Cleber: Antes de jogar bola eu trabalhava desde os 12 anos pra ajudar meus pais. Vendia cerveja, picolé, amendoim, óculos. Tudo na praia. Desde moleque sempre trabalhei, corri atrás dos meus sonhos. Nada foi fácil para a gente. Hoje é muito bom ver que eles [os pais, Tereza e Jairo] estão felizes, que estou conseguindo ajudar. Minha infância foi assim, nada demais. Nem gosto de contar muito senão começo a chorar, fico doído.

 E seu primeiro esporte não foi futebol.
Cleber: Não. Foi boxe e capoeira. Boxe foi primeiro. Boxe de rua. Trenava eu e um cara do meu bairro. Vi que eu tinha o dom e aí eu comecei a treinar. Tenho [o dom] até hoje.

Não pensa em continuar treinando aqui?
Cleber: Eu vou começar agora, já arrumei um lugarzinho. Eu gosto. É um esporte que eu nunca vou largar. Me deixa bem, feliz. Fico muito calmo, é uma coisa que me dá uma adrenalina diferente.

 Mas você chegou a lutar?
Cleber: Cheguei a lutar... Cheguei a apanhar, né? Eu apanhei, só. [risos] Eu não era tão grandão não. Era grande, mas não grande no boxe. Tentei, mas não consegui nada. Mas nunca gostei de bola. Comecei a jogar depois de 16 anos. Me chamaram pra jogar bola na rua e eu disse: 'Vamos'. Aí me viram e me chamaram para ir jogar em Brasília. Aconteceu do nada.

Lá em Salvador o boxe é forte pelo Popó, né?
Cleber: Sim, eu peguei essa fase.
 Você já teve a oportunidade de conhecer ele?
Cleber: Não, não tenho vontade de conhecer não. Eu sou um cara que preservo muito onde eu moro, então é melhor preservar aqueles que me apoiaram, aqueles que conviveram com isso.

 Mas você tem alguma história com o Popó?
Cleber: Não, não tem história nenhuma. É que eu sou assim.

 Mas alguma vez você tentou falar com ele, pedir alguma ajuda ou algo assim?
Cleber: Não, nunca tentei não. Onde eu moro, ninguém fala de onde eu venho. Da suburbana, da cidade baixa. Dizem que a gente não presta, só presta quem vem de cima, da cidade alta. Então eu preservo onde eu moro. Então quero dar valor a quem vem de onde eu moro, e não de outro lugar. Por isso eu não peço autógrafo a ninguém, sou sossegadinho.

Nota da Redação: A chamada 'cidade baixa' de Salvador é a região da cidade onde se concentram os bairros mais pobres da capital baiana, na comparação com a 'cidade alta'.

Você gosta muito de Salvador?
Cleber: Eu amo minha cidade, eu amo meu bairro.

 Qual é o seu bairro?
Cleber: Suburbana. Sou suburbano nato. Sou de Mirante de Piripiri.

 E como a capoeira apareceu?
Cleber: É de praticar. Queria ter um corpo legalzinho, dar uns mortalzinho.

: E o futebol?
Cleber: Ah, me chamaram para jogar um torneiozinho com os moleques, fui lá e joguei. Eu não era muito fã de bola não, cara. Nunca gostei. Achava perda de tempo. Fica aí jogando e não dá dinheiro. Meu negócio era ganhar dinheiro. Então um dia eu fui e joguei um torneiozinho no bairro lá. Aí o cara gostou de mim. Nem de zagueiro eu jogava.

Jogava do quê?
Cleber: Volante.

 Era bom?
Cleber: [risos] Até hoje eu não sou bom.

E aí você foi pra Brasília?
Cleber: Fui. Cheguei e joguei num time chamado Legião.

Era o time que homenageava o Renato Russo.
Cleber: Isso.

 E você gosta de Legião Urbana?
Cleber: [risos e sinal de não com a cabeça]

O que você gosta de ouvir?
Cleber: Axé. Axé da Bahia, que aqui vocês chamam de axé. Lá é pagode para nós.

 Já foi muito ao Carnaval de Salvador?
Cleber: Lógico, meu filho. Vou deixar faltar?

 Esse ano você foi?
Cleber: Ô.

 Nesse ano, titular do Corinthians, deve ter sido bem recebido.
Cleber: Não [risos].

 Como assim?
Cleber: Não mudou nada. Cheguei lá e fiquei na pipoca. Gosto de muvuca, gosto de folia. Aí depois fiquei num camarotezinho, fiquei na resenha e depois fui pra casa.

 E ninguém sabia que ali estava o zagueiro do Corinthians?
Cleber: Não, eu só ando de bonezinho na cara em Salvador.

: Mas voltando, você foi pra Brasília jogar no Legião. Como foi?
Cleber: Foi sofrido um pouquinho, né? Ruim demais. Uma fase ruim que eu passei na vida. Águas passadas.

: E como você superou essa fase?
Cleber: Eu conheci um cara que eu sou ingrato com ele até hoje, que é o Bill, de Paracatu. Sou ingrato com ele até hoje. Foi um cara que me ajudou. Eu tento falar com ele, mas ele não quer. Ele me levou para Paracatu, onde eu trabalhei porque eu saí do Legião. Eu não joguei só no Legião, né? Eu saí e fui jogar no time dele, em Paracatu. Uma cidade boa, pequenininha. Ele me ajudou, me levou pra alguns testes, não deu certo. Aí eu voltei pro Legião Urbana de novo. Me profissionalizei, deu certo lá. Fiquei pouco tempo, um ano e meio em Brasília. E aí vim pra Jundiaí.

 E quem te trouxe?
Cleber: Ele, o Bill Paracatu.

 E aí vocês perderam contato?
Cleber: Foi, por algumas coisas entre a gente. E eu sou ingrato até hoje.

É estranho ouvir isso. No ano passado o Tite se emocionou justamente porque você foi dizer a ele o quanto era grato a ele.
Cleber: É porque eu não tive a chance de falar com ele quando eu consegui vir pro Corinthians. Não consegui falar o que eu queria falar. É uma coisa que só eu e ele sabemos. Eu estou julgando a mim mesmo, porque eu sei do jeito que eu sou.

: Como você ficou quando soube que o Corinthians queria te contratar?
Cleber: O Beto [Rappa, empresário do jogador] chegou falando que o Corinthians estava interessado. Fiquei ansioso, porque é um time que eu gosto, o time que eu torcia. Sou corintiano nato.

: Mas você nem gostava de futebol.
Cleber: Eu? Mas não tem nada a ver com gostar de futebol. É sério. Sou corintiano. Meu irmão é corintiano. Meus amigos da escola são corintianos. Ainda mais quando eu vim pra cá. Ficou mais ainda. Sem resenha.

 Mudou alguma coisa depois que você veio pra cá por causa da fama?
Cleber: Muda. Eu mudei. De uma casa pra outra [risos]. Na minha vida não muda nada não. Clebiinho não muda nada. Muda o trabalho.

 Você teve uma fase complicada quando você soube que teria um filho, certo?
Cleber: Não gosto de falar. Falo do meu filho. Meu filho é fenomenal. Está em casa comigo. Tem três anos de idade, o Pedro Henrique. É o meu mascote. Meu xodó, meu tudo. Moleque que só briga com o pai, porque o pai só perturba o filho. O moleque é muito bom. Foi uma coisa que no passado eu fiquei meio confuso. Mas quando ele chegou mudou. Mudou minha vida, mudou minha cabeça, meu pensamento. Meu filho é tudão.

 O Gil, seu parceiro de zaga, também é fascinado pelo filho dele, que tem mais ou menos a mesma idade. Vocês falam sobre isso?
Cleber: O Gil fala: 'Traz seu moleque pra brincar aqui'. Eu falo: 'Para Gil, se eu trouxer o moleque pra brincar vai quebrar tudo'. Os dois têm três anos. Criança é bom demais. Dou o maior valor.

 Foi nessa época que você fez uma cirurgia séria no joelho.
Cleber: Foi no ligamento cruzado do joelho esquerdo. Foi ruim demais. Oito meses parado, e no Paulista de Jundiaí ainda. Estava recebendo bem [com ironia]. Foi uma fase ruim. Uma coisa que aconteceu no treino. Não gosto nem de lembrar.

 Você pensou muitas vezes em desistir?
Cleber: Toda hora. Eu pensava em ir embora. Queria voltar pra minha mãe, meu pai. É doído. Mas graças a deus está indo.

 Onde você acha que vai estar em cinco anos?
Cleber: Em cinco anos? Vou estar na suburbana.

 Você é um cara bastante simples, caseiro. Se pensa jogando em um Real ou Barcelona da vida?
Cleber: Pra quê ir tão longe pra ser feliz? Não precisa. O Corinthians é tudo pra mim.

 Eu sei que você recusou o Basel, da Suíça, quando ainda estava na Ponte.
Cleber: É. Para quê sair do Corinthians? Só se me mandarem embora, né? Aí vou ter de ir. Mas por mim...

Você gosta de ver futebol?
Cleber: Não tenho paciência não. Estava passando o jogo ali do Barcelona agora e eu nem olho. Olho pra cá e vou embora.

Nota da Redação: A entrevista aconteceu durante a primeira partida entre Barcelona e Atlético de Madri, pela Liga dos Campeões.

 Não dá vontade de jogar naquele estádio bonito, com aquela pompa?
Cleber: Olha o estádio do Corinthians aí. Vai estar lotado também no Brasileiro. Mesma coisa. Não sou muito deslumbrado não. Tenho um foco, e o foco é no Corinthians. O que acontecer depois aconteceu. Por enquanto é foco no Corinthians.

: E a seleção?
Cleber: Minha seleção é o Corinthians.

 Mas e se te chamam para a seleção? No segundo semestre, começando outro ciclo...
Cleber: Pra um amistoso? Ah, vou lá dar um joguinho, né?

: Numa dessas você vira titular da Copa de 2018.
Cleber: Ah, tá bom. Mãe Dinah, você?

Nem se o Tite for o técnico? Aí você teria mais chance.
Cleber: Ah, tá bom. Começou... [risos]
 Mas você não vai ficar ansioso na convocação no segundo semestre?
Cleber: Não. Não vou. Mãe Dinah, Mãe Dinah...

 Mudando de assunto. Você já viu que te chama de Akon, aquele cantor estrangeiro?
Cleber: Parece?

 Não sei, já te chamaram assim? Pelo visto te enchem com isso.
Cleber: Pô... Eu sou o Akon [faz cara de contrariado].

 Você não gosta disso?
Cleber: Não, eu sou o Cleber, pô. Falam na internet do Akon do Corinthians.

 Akon e Avatar.
Cleber: Avatarzinho parece, né? Se pintar de azul... É esse narizinho aqui. Avatar é melhor que o Akon.